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sábado, 27 de novembro de 2010

SANTA CATARINA : Será o Rio de hoje a Florianópolis de amanhã ? (PARTE 1)

Para PF, Comando Vermelho pode desembarcar em SC. Polícia Civil acha que este risco é muito remotoSe a sintonia na visão dos riscos é importante para o enfrentamento do crime organizado, as polícias Federal e Civil já começam mal em Santa Catarina. Enquanto uma diz que o desembarque do Comando Vermelho por aqui é muito provável, outra considera o risco remoto. Menos mal que ambas entendem que é preciso ficar alerta.

No mês passado, um policial federal estava numa joalheria de Curitiba quando um assalto foi anunciado. Ele reagiu e acabou morto. Não percebeu que eram cinco bandidos com coletes à prova de balas e fortemente armados. A investigação da Polícia Federal revelou o motivo de tanta estrutura: os bandidos eram do Comando Vermelho, organização criminosa que controlava a Vila Cruzeiro até quinta-feira, quando seus integrantes foram expulsos pela polícia do Rio.

O delegado da Polícia Federal (PF) catarinense Ildo Rosa diz que interceptações telefônicas feitas para localizar os assaltantes revelaram o interesse da facção criminosa por Santa Catarina. Os grampos teriam mostrado líderes da organização no Rio de Janeiro falando em criar conexões aqui no Estado. A meta: dominar pontos de venda de drogas.

Toda a estrutura necessária seria colocada à disposição pelos chefes dos morros cariocas, inclusive armas para eventuais confrontos, para concretizar o objetivo em terras catarinenses. O delegado acredita que, se este projeto for posto em prática, haverá resistência de traficantes locais, o que pode ser mais um ingrediente para enfrentamentos.

O diretor estadual de Investigações Criminais (Deic), delegado Cláudio Monteiro, entende que o maior atrativo catarinense para os criminosos de outros estados é o mercado consumidor. Ele afirma que a Grande Florianópolis e o Litoral Norte são as principais regiões de comércio de drogas.

O delegado da PF diz que, para evitar a entrada da organização criminosa, é preciso copiar o que a polícia do Rio de Janeiro fez na última semana: ocupar áreas de atuação dos traficantes. Ele lembra que a Secretaria de Segurança Pública de SC não tem contingente suficiente para povoar todas as regiões. Por isso, sugere a presença nos locais mais complicados, não só pela força, mas com ações de educação, saúde e lazer.

Para identificar se membros do Comando Vermelho ou de outra organização criminosa migrarão do Rio de Janeiro para Santa Catarina, o delegado da PF sugere manter o foco nos bandidos locais, que vão demonstrar se houver invasão por grupos de fora.

Outra recomendação é prestar atenção às informações repassadas pelas comunidades, como as ligações para o disque-denúncia. O trabalho dos soldados que atuam nas áreas de risco também é importante. Policiais militares obtêm informações, e é preciso garantir que elas cheguem ao setor de inteligência.

O diretor de Informação e Inteligência da Secretaria de Segurança Pública, delegado Fernando Caieron, não acredita que os integrantes do Comando Vermelho vão optar por Santa Catarina. Diz que estudos já comprovaram que quando a situação aperta no Rio de Janeiro, aumenta a criminalidade em Minas Gerais e no Espírito Santo. Ele assegura que se os bandidos vierem para o Estado, haverá reação das polícias Civil e Militar.

O secretário de Segurança Pública, André Mendes da Silveira, referenda a afirmação do delegado Fernando Caieron. Ele afirma que o monitoramento feito pela Diretoria de Inteligência do sistema prisional revela que as relações dessas facções são maiores com criminosos de outros estados, onde a rede de contatos também é mais ampla.

Histórico do Rio mostra o que não se pode fazer

O especialista do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Guaracy Mingardi, diz que a situação do Rio de Janeiro é fruto de vários e antigos fatores. A mudança da capital federal para Brasília, nos anos 1960, foi o primeiro complicador, porque levou os melhores policiais civis e militares para o Planalto Central. O governo do Estado ficou com a missão de reestruturar as corporações trabalhando com profissionais de qualidade questionável.

O tempo passou e, segundo Mingardi, o Rio continuou errando. O grau de autonomia exagerado que as favelas sempre tiveram permitiu que grupos se organizassem. A geografia acidentada ajudou a bandidagem. Novo impulso para a formação das organizações criminosas ocorreu quando o governo militar misturou presos políticos com assaltantes de bancos comuns, na década de 1970.

Os bandidos saíram da cadeia na mesma época em que houve o incremento do abastecimento de cocaína, em 1977. A conjunção dos fatores permitiu o crescimento da então Falange Vermelha. Mingardi lembra que a demonstração de força que ocorreu em 1986, quando a organização criminosa tomou o Morro Dona Marta, serviu como afirmação.

Ele diz que o poder público falhou ao não tratar o problema com a importância devida nas décadas de 1980 e 1990. Outro erro foi a forma como a Polícia Militar agiu. O especialista lembra que a corporação era o único braço do Estado a subir as favelas, e aparecia sempre para oprimir. A política de invadir barracos sem mandados de busca e apreensão opôs moradores e policiais. O especialista lembra que o ex-governador Leonel Brizola ficou estigmatizado por proibir a prática do “pé na porta”.

– Criou-se a falsa impressão de que ele foi conivente com o crime.

A falta de credibilidade da polícia chegou a um ponto em que, na década de 1990, a população dos morros procurava os traficantes quando tinha alguma questão para resolver. Eles passaram a ser a lei a e substituir o poder público. A corrupção também atrapalhou. Mingardi diz que não existe crime organizado sem conivência do Estado.

Por estes motivos, as invasões de soldados em favelas não produziram resultados duradouros. Para o especialista, polícia sem confiança é igual a tropa de ocupação. Não muda nada e é vista com hostilidade. Ao tentar resgatar a credibilidade de sua polícia com as ações dos últimos dias, talvez o Rio esteja começando a reparar erros históricos.
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FONTE : jorn. FELIPE PEREIRA, Diário Catarinense, edição de 28/11/2010.

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