Madeira Responsabilidade pelo clima em debate
Área alagada próxima à usina de Santo Antônio, em Rondônia. O estado sofre com a maior cheia já registrada no rio Madeira. Foto: ©Greenpeace / Lunae Parracho

Nessa quarta-feira (26), a COP (Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima) foi tema em Brasília. Em audiência pública convocada pelo Ministério das Relações Exteriores, representantes da sociedade civil e do Itamaraty debateram os resultados da COP-19, em Varsóvia, os preparativos para a COP-20, que acontecerá em Lima este ano, e os rumos futuros do novo acordo global que deverá substituir o Protocolo de Kyoto a partir de 2020.
O ministro Everton Lucero, membro da delegação brasileira na COP de Varsóvia, afirmou que a conferência não trouxe tantos resultados quanto o governo gostaria. “Nós esperávamos pelo menos uma sinalização favorável por parte dos países que assumiram compromissos de trazer à mesa de negociações financiamentos, meios de implementação e tecnologias. Consideramos isso essencial para a continuidade na construção de um acordo. Em 2010 foi firmado um compromisso de mobilizar U$ 100 bilhões por ano até 2020, mas não houve uma indicação clara de como se chegaria a esse montante. Consideramos que esses resultados permitem que o jogo siga”, argumentou.
A audiência foi pautada principalmente na proposta que o Brasil levou à Conferência do Clima da ONU de que as responsabilidades históricas de cada país na elevação da temperatura do planeta sejam medidas. Na esteira desse debate, Sérgio Leitão, diretor de Políticas Públicas do Greenpeace, lembrou um discurso datado de 1993 do embaixador Paulo Nogueira, um dos responsáveis pela realização, no Brasil, da conferência Eco 92, e um dos membros do Ministério que historicamente mais trouxe a discussão sobre aquilo que agora se chama de “responsabilidades históricas”.
“De 1993 para cá, muita coisa mudou, o Brasil é outro. O Brasil de 2014 felizmente não é o Brasil de 1993. Incorporamos mais de 40 milhões de pessoas ao consumo, triplicamos nossa produção agrícola. Mas o que me preocupa no debate das responsabilidades históricas é ele escamotear as responsabilidades que o Brasil tem em continuar fazendo seu processo de desenvolvimento sem que isso signifique a retomada do desenvolvimento de uma forma ecologicamente irresponsável, como chamava atenção o embaixador Paulo Nogueira nesse texto de 93”, afirmou.
Sergio Leitão frisou que o Brasil já é um país capaz de dar conta de seus problemas e não pode usar a boa aceitação da proposta das responsabilidades históricas por parte dos países não desenvolvidos para se furtar daquilo que é necessário fazer nacionalmente em termos ambientais. E, seguindo com o raciocínio de Paulo Nogueira, questionou as mudanças de paradigma reais que ocorreram da época da Rio 92 até hoje.
“O embaixador desse texto se perguntava: até que ponto, por exemplo, podemos conceber a utilização de veículos automotores como carro-chefe de nossa política industrial? Mudou isso em 2014? Não, se agravou. Até quando poderemos continuar a ter um sistema de transporte essencialmente rodoviário, fortemente individualizado e altamente consumidor de petróleo? Mudou isso de 1993 para cá? Não. Só se agravou. É o mais grave problema ambiental, climático e social, que gerou todo o conflito que se iniciou no país a partir de junho do ano passado”, ressaltou.
Por fim, ele citou a cheia histórica no rio Madeira, em Rondônia, que atingiu 18,43 metros no último dia 24, como um dos efeitos explícitos das mudanças climáticas, e incitou o senso de urgência do governo brasileiro. “Vamos manter essa postura de sermos ricos na hora de destruir, mas pobres na hora de preservar?”, questionou.
Os representantes do Itamaraty agradeceram as intervenções e finalizaram a audiência mirando o futuro. “Temos agora a responsabilidade de preparar a nossa participação em Lima, de modo que haja uma continuidade na construção de um acordo. Naturalmente que a negociação é sempre muito difícil – diria até emperrada – por questões de divergência de visão. Temos uma conferência que não trata só de clima, mas é uma convergência de questões que envolvem economia, emprego, desenvolvimento. Ela é transversal em matéria de impactos na sociedade, e por isso a participação civil é tão importante”, concluiu o ministro Lucero.
* Publicado originalmente no site Greenpeace.
(Greenpeace)