Na Cidade Ademar, um enorme espaço verde e vazio corta o bairro entre o Jardim Apurá, o Santa Amélia e a represa Billings, que abastece Diadema, São Bernardo do Campo, Santo André e a São Paulo. Caminhando pelas colinas com vegetação rasteira, escapando das fezes de vaca, a impressão que se tem é de estar em algum pasto de interior. Até que se olha para o lado: lá está a paisagem da imensa periferia paulistana, com suas casinhas de tijolo aparente sobrepondo-se umas às outras. Estamos no Parque dos Búfalos.
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A área era uma fazenda que, até 1992, acomodava os animais que dão nome ao parque. Com a expansão populacional da região, começou a ficar perigoso manter os ruminantes no local. Com a ausência dos búfalos, o terreno começou a ser ocupado pelas pessoas que hoje lutam para que as 13 nascentes, trechos de mata atlântica original e o pasto continuem como estão ou melhorem – mas não sejam transformados em 3.800 unidades de habitação popular para o programa Minha Casa, Minha Vida, o Projeto Espanha.
Parque da comunidade
Em uma das pontas do parque, três voluntários trabalham debaixo do sol do final da manhã de um sábado. Anderson Jefferson, 32, eletricista, revela porque está lá: “Eu estou aqui desde criança, vixe, se eu começar a lembrar do tanto que eu já aprontei aqui. Aqui tem tucano, arara, um monte de passarinho. Quer ver, fica quieto, tá ouvindo? É o silêncio. Onde mais na zona sul você vai ouvir esse nada? Para mim, tem que continuar assim.”
Voluntários do Parque dos Búfalos posam para foto em frente ao muro do terreno. À direita, está Jeferson Anderson.Pedro Ribeiro Nogueira l Portal Aprendiz
Voluntários do Parque dos Búfalos posam para foto em frente ao muro do terreno. À direita, está Jeferson Anderson.Pedro Ribeiro Nogueira l Portal Aprendiz

Cláudio Milg, 43, engenheiro, acredita que o local deve permanecer intocado como compensação pelas transformações da região. Ao redor, tudo virou área de habitação. Enquanto conversamos, um senhor, de bicicleta, se aproxima entregando folhetos assinados por movimentos de moradia, pedindo a utilização daquela área para o Projeto Espanha. A discussão se forma e ambos os lados trocam argumentos. Um afirma que a área não tem infraestrutura para receber mais pessoas. O outro diz que as pessoas que virão serão de lá mesmo. Os demais duvidam.
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O dilema é cruel: de um lado, a necessidade de moradia e da construção de habitações populares, do outro, a necessária preservação de áreas de mananciais em uma São Paulo em plena crise hídrica, aliada ao direito ao lazer, ao meio ambiente e ao verde.
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Segundo a Prefeitura de São Paulo, o conjunto residencial foi aprovado “por todas as instâncias municipais e estaduais e agrega intervenções de saneamento, ambiental e habitacional. Eles ainda afirmam que não haverá a perda do parque, mas o ganho de um com 550 mil metros quadrados de área e que as nascentes do terreno serão preservadas, junto com a implantação de 28 mil novas mudas, construção de creche, escolas e um posto da Guarda Civil Metropolitana. Além disso, alegam que mais da metade do terreno será permeável e que os moradores do conjunto virão de áreas de risco e de manancial da região.
Após as obras, o parque ficará dividido.Após as obras, o parque ficará dividido. Foto: Prefeitura de São Paulo
Após as obras, o parque ficará dividido.Após as obras, o parque ficará dividido. Foto: Prefeitura de São Paulo

Os moradores questionam as informações da prefeitura. As construções, além de dividir o parque em três unidades, iriam ser feitas na parte alta do terreno, que são importantes para a captação de água para a represa e para as nascentes. Também problematizam o fato de que os condomínios serão fechados, não permitindo o acesso público ao território. “Não adianta murar a nascente. Isso não é preservação. Por que pode ter o Ibirapuera no Centro e aqui tem que ser o que sobra? E se fosse para construir esse monte de coisa que eles falam, por que até agora não fizeram?”, questiona um defensor do parque que prefere não se identificar.
Precisa ser ali?
Os defensores do Parque dos Búfalos também dizem que na área existem seis outros terrenos que poderiam ser usados para habitações populares. Em um deles, há duas semanas, acontece a ocupação Antônio Conselheiro, organizado por lideranças comunitárias ligadas à causa do parque.
Uma das 11 nascentes do Parque.Uma das 11 nascentes do Parque. Foto: Pedro Ribeiro Nogueira
Uma das 11 nascentes do Parque.Uma das 11 nascentes do Parque. Foto: Pedro Ribeiro Nogueira

“Estamos aqui para mostrar que existem outras áreas na região que podem ser usadas para moradia. Esse terreno aqui, inclusive, é mais próximo de eixos estruturantes e conta com mais infraestrutura”, afirma outro defensor do parque que também prefere não se identificar por medo de represálias.
Área é mantida por voluntários da comunidade.Área é mantida por voluntários da comunidade.Pedro Ribeiro Nogueira l Portal Aprendiz
Área é mantida por voluntários da comunidade.Área é mantida por voluntários da comunidade.Pedro Ribeiro Nogueira l Portal Aprendiz

O terreno do Parque dos Búfalos tem 994 mil metros quadrados e foi declarado, em 2012, pelo então prefeito Gilberto Kassab (PSD), área de utilidade pública. Após as demarcações iniciais feitas para o início das obras, uma ação popular perpetrada em dezembro tenta barrar a construção e tem atrasado o começo da construção.
O impasse do Parque dos Búfalos mostra que na periferia de São Paulo não existem saídas fáceis. Na urgência de resoluções para questões emergenciais, a cidade pode perder a oportunidade de oferecer às centenas de milhares de habitantes da região da Pedreira e da Cidade Adhemar, um parque de dimensões próximos ao Ibirapuera, o parque mais próximo dali, há duas horas de transporte público. (Portal Aprendiz/ #Envolverde)
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* Publicado originalmente no site Portal Aprendiz.
(Portal Aprendiz)